Vinte dois anos.
Vinte e dois anos é muito pouco.
Uma bala, sem dó, fez o cara virar pó.
Aliás, ele gostava do pó e voltou ao pó.
Numa pedra escreveram seu nome.
Para sempre… nunca mais.
Terra, terra, cinza e pó.
Vinte e dois anos é muito tempo.
Alguns anos de escola, outros tantos de esmola.
Não me lembro da escola. Só lembro da esmola.
Fui humilhado com roupas usadas para ir na escola.
Depois, ah! Depois, o reconhecimento.
Sou da linha de frente. Mato sim, e daí?
Vai encarar? Vai encarar?
Agora sou da linha de frente. Sai da frente.
Quando a vida anda devagar. Se arrastando como lesma lerda.
Então* a gente vai na carreira. A vida fica da hora.
A gente aspira, as mina pira.
É ligeiro. É maneiro. Cheiro, cheiro.
Mas é preciso dinheiro.
Pego o trinta e aponto pra pinta: “me passa a grana”.
Sou da linha de frente.
E daí? Vai encarar? Vai encarar?
Um dia ganhei um ponto, um ponto pra mim.
Era eu na linha de frente.
Daí chegou um cara. Tinha só vinte e dois.
Não quis pagar, não tinha grana.
Tava duro como pedra. Queria pedra, queria pó.
Uma bala, sem dó, fez o cara virar pó.
Não tinha grana, não tive pena.
Matei sim, e daí? Vai encarar?
Hoje cumpro pena.
Vinte e dois anos é muito tempo.